15 set 2021 | Beleza
Vamos falar sobre a importância do cabelo para a construção da identidade? Muito além de uma mera “vaidade”, se sentir confortável com a aparência está diretamente ligado com a autoestima e o desenvolvimento pessoal. Para pessoas negras, o processo de enxergar-se belo muitas vezes se torna árduo devido a casos de racismo, incluindo preconceitos relacionados à cor da pele, como também ao tipo de cabelo. Nesse contexto, as tranças afro surgem para mulheres e homens negros como uma ferramenta de resistência e expressão cultural. Em entrevista ao Site MT, a trancista Isabelle Galeazzi, idealizadora da Nzinga Trancismo, fala sobre o tema e elenca os principais tipos de tranças afro, como as box braids, fulani braids e nagô.
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Box braids ou tranças soltas: O modelo mais tradicional, também conhecido como tranças soltas, é feito na maioria da vezes com adição da fibra sintética jumbo, garantindo uma variedade de cores e tamanhos. Elas são um estilo de penteado protetor onde o entrançamento é feito nos fios naturais. Braids se traduz como tranças, e box significa “caixa”. O nome do penteado se dá porque as tranças são feitas com o cabelo dividido em mechas “quadradas”, ou seja, cada trança fica “em uma caixa”. Lindas, não é?
Chanel braids ou box braids chanel: Adaptação das tranças soltas ao corte chanel. Entre as muitas vantagens de usar box braids chanel, está o fato de que, com o cabelo curto, o penteado fica mais leve, fácil de cuidar e leva menos tempo para ser trançado.
Nagô sem extensão: Tranças rentes à raiz feitas com o próprio cabelo e costumam apresentar desenhos diversos. Um fato interessante é que esses diferentes desenhos trançados costumavam representar classes, religiões e etnias para mulheres e homens africanos.
Nagô com extensão: Nagô com adição de material. Também pode apresentar desenhos diversos com o diferencial de tamanho, segundo Isabelle.
Tranças fulani ou fulani braids: E vamos de estilo! As fulani braids são tranças soltas atrás com tiara nagô apenas na seção da frente do cabelo. Confere as fotos:
Knotless braids: Uma técnica inovadora de aplicar a extensão sem realizar um nó na raiz, sendo assim chamadas em português de tranças sem nó, proporcionando um visual menos volumoso, mais leve e flexível.
Goddess braids: Uma tendência “gringa” que consiste no uso de fios cacheados soltos adicionados às tranças, garantindo um maior volume e fluidez ao cabelo. Lindas!
Bubble ponytail: Não necessariamente exclusivo do trancismo, esse penteado consiste em um rabo de cavalo com algumas ligas espalhadas no comprimento, criando uma estética de bolinhas, ou bolhas, como sugere o nome do inglês traduzido para “rabo de cavalo em bolhas”.
Agora que você entendeu o “nível básico”, vamos para o avançado. Isabelle explica que existem três procedimentos básicos do trancismo, sendo eles: as tranças, os twists e os locs, que também são conhecidos como dreads. “Todos são considerados estilos protetivos, podem ser feitos em diversos tamanhos ou espessuras e apresentam durabilidade máxima de três meses”, comenta.
“A trança pode ser considerada o procedimento mais versátil tendo em vista que podem ser soltas ou nagôs enraizadas no couro cabeludo, com adição de material ou não, com ou sem nó na raiz – rendendo inúmeras possibilidades”,
afirma Isabelle Galeazzi.
Já os twists, parecidos com as tranças, diferenciam-se por serem feitos apenas com duas mechas torcidas, ao invés de usar três mechas, tendo seu formato mais parecido com um “cachinho”.
De acordo com a trancista, os locs, também conhecido como dreads, têm uma estética mais cilíndrica e podem ser feitos naturalmente, com fibra ou com lã de forma removível. Nesse grupo, os dreads de lã surgem como uma opção removível dos dreads naturais tradicionais, usando a lã como extensão e encapamento do cabelo natural.
E olha que os locs também podem ter versões estilosas, coloridas e divertidas, a exemplo dos dreads borboleta que possuem algumas pontinhas para a fora dos locs, criando uma versão mais despojada dos dreads tradicionais.
Trancista há três anos, Isabelle Galeazzi começou a usar tranças quando passava pelo processo de transição capilar, ou seja, quando parou de fazer procedimentos químicos no cabelo para assumir os fios cacheados. “Quando estava passando pela transição capilar, meu cabelo apresentava diversas texturas e aquilo me incomodava, foi nesse momento que comecei a usar tranças para me sentir mais à vontade comigo mesma. Não eram box braids como faço hoje, eram tranças embutidas mais comuns, ainda assim isso era suficiente para que muitas das minhas colegas de sala pedissem igual”, lembra.
Ainda na escola, Belle – como é carinhosamente conhecida pelos clientes – começou a fazer tranças nas amigas. “Pude perceber como era bonito ver as pessoas se sentindo bem consigo mesmas por causa de algo que eu tinha feito. Muitas amigas falavam que eu deveria trabalhar com isso, mas nunca levei muito a sério até a necessidade por autonomia financeira realmente chegar. Dessa forma, comecei a gerar uma renda que me ajudava com pequenos gastos cotidianos dos meus estudos”, conta.
Segundo ela, o trancismo e a evolução profissional na área estão ligados à sua jornada de autonomia. “Considerando nossa agenda política enquanto povo preto, a emancipação será por muito tempo nosso principal objetivo e é no mínimo satisfatório perceber que essa atividade tem proporcionado autonomia não só pra mim, mas também para muitas outras“, afirma.
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Ainda falando sobre empreendedorimo negro, Isabelle reitera a importância do trancismo no contexto histórico-cultural. “Gosto de acreditar que somos hoje o sonho dos nossos ancestrais que tanto prezaram pela liberdade, aqui considerando não apenas o contexto de alforria à escravatura, mas principalmente ser livre das sequelas que esse período deixou. Vejo o trancismo como uma ferramenta extremamente potente para a concretização desse sonho porque, para além do cabelo, o trancismo tece uma rede de apoio entre pessoas pretas e impacta diretamente no nosso direitos de ser: é um posicionamento contra o genocídio sistemático das nossas subjetividades. Trancismo é uma forma de manter a memória viva“, finaliza.