24 fev 2022 | Notícias
Raquel Machado, coordenadora do Mestrado e Doutorado em Direito na Universidade Federal do Ceará, fala sobre o protagonismo do Nordeste nas lutas pelo voto feminino
Nesta quinta-feira (24), o Brasil celebra o aniversário de 90 anos da sanção que garantiu oficialmente às mulheres acima de 21 anos os direitos de votar e serem votadas no país. Mas você sabia que as nordestinas tiveram pioneirismo nesse cenário político? São naturais do Rio Grande do Norte, tanto a primeira eleitora brasileira, a professora Celina Guimarães que votou pela primeira em 1927, como a primeira política eleita, Alzira Soriano que assumiu a prefeitura de Lajes, em 1929.
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Mas se o primeiro Código Eleitoral que garantia o “voto feminino” foi sancionado em 24 de fevereiro de 1932 no Brasil, como as potiguares conseguiram dar passos na cena política antes desta data? Celina e Alzira entraram para a história graças à Lei Estadual nº 660, de 25 de outubro de 1927, que tornava o Rio Grande do Norte o primeiro estado a estabelecer a não distinção de sexo para o exercício do voto. Na época, elas estamparam jornais do mundo todo por estarem entre as pioneiras da América Latina. Conheça mais nordestinas que estiveram à frente do direito ao voto para mulheres.
Josephina Álvares de Azevedo
Nascida no Recife, a jornalista editou e fez circular, a partir de 1888, o primeiro jornal de abrangência quase nacional que se tem notícia no País com a temática feminina, “A Família”. Ela defendeu o direito ao ensino, a ocupação de cargos públicos e o voto.
Leolinda de Figueiredo Daltro
Responsável pela fundação do Partido Republicano Feminino, em 1910, Leolinda foi uma professora e indigenista baiana que dedicou sua vida à defesa dos direitos das mulheres, especialmente o voto.
Almerinda Farias Gama
Nascida em Maceió, a advogada e sindicalista foi uma pioneira na atuação de mulheres negras na política brasileira e foi uma das duas primeiras mulheres a participarem do processo de formação da Assembleia Constituinte de 1934.
Segundo Raquel Machado, coordenadora do Mestrado e Doutorado em Direito na Universidade Federal do Ceará, é notório o protagonismo do Nordeste nas lutas pelo voto feminino, mas reforça que ainda é preciso percorrer um longo caminho para garantir direitos mais amplos para todas as mulheres.
“O Nordeste tem muito machismo. Então, esse protagonismo inicial é um marco histórico simbólico que deve ser sempre resgatado para que as mulheres nordestinas percebam a sua força. Nós devemos combater o machismo, não porque existe uma superioridade da mulher, não porque a mulher queira ocupar o lugar do homem, mas, porque a mulher tem as mesmas capacidades intelectuais e, portanto, política que o homem — já que se trata de uma escolha social”, afirma a advogada, membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB.
“A nossa sociedade será muito melhor com a participação igualitária das mulheres. O interesse de participação da mulher na política não deve ser só das mulheres, mas de todos”,
reitera Raquel Machado.
De acordo com dados do Inter-Parliamentary Union, organização que reúne os parlamentos dos países ligados à ONU, o Brasil está na 142ª posição no ranking de participação de mulheres no congresso nacional. De todas as Américas, o Brasil supera apenas o Paraguai (144ª), Bahamas (151ª) e Belize (154ª). O país só “perde” para países economicamente mais pobres, com índices educacionais mais baixos, como Argentina e Peru, e até para uma democracia mais fragilizada, como é o caso da Venezuela.
De acordo com Raquel, o direito de voto faz parte de um caminho para participação política e deve envolver o direito das mulheres de terem voz nas tomadas de decisões públicas. “Enquanto, efetivamente, não for considerada a voz da mulher nessa tomada de decisão nós ainda temos muito o que avançar. A luta é longa, mas temos que continuar porque ainda não estamos em um patamar satisfatório. Nós temos eleitoras, mulheres ativas em movimentos e participantes da política informal, mas, além disso, é necessário que tanto elas sejam mais respeitadas como eleitoras — nas diversas políticas públicas feitas —, como devem integrar mais os quadros políticos com acesso aos mandatos”, explica.
Outros recortes, como questões de raça e desigualdade social, também devem ser consideradas nesse debate, pontua Raquel. “Quando nós pensamos em direitos de voto da mulher, temos que considerar os vários ‘tipos’ de mulheres. É necessário que todas tenham voz. Quando nós olhamos para pessoas com dificuldade econômica e para mulheres negras, percebemos que elas têm mais dificuldade de inserção. Assim, é necessário ainda desenvolver uma maior conscientização desse poder político para se sentirem fortes e pleitear direitos”, comenta a advogada.
Segundo a pesquisadora, a participação política está diretamente relacionada a outros direitos como os civis e os sociais. “Para a mulher ter igualdade no trabalho e econômica, ter os mesmos salários e os mesmos direitos sociais, como uma licença maternidade digna, é necessário que políticas públicas sejam desenvolvidas, pois não tem como desenvolvê-las se a mulher não exerce os direitos políticos, seja votando ou participando do poder”.