3 set 2020 | Notícias
Área normalmente vinculada à prática em fóruns, tribunais e órgãos públicos, o Direito é também uma ciência e, portanto, evolui junto com o estudo acadêmico. Defensora desta ciência social como uma importante ferramenta de transformação das relações humanas, a doutora em Direito Constitucional pela Universidade Federal da Minas Gerais (UFMG), Ana Maria D’Ávila Lopes, não apenas conduz pesquisas importantes no meio, se dedicando à proteção nacional e internacional dos direitos e garantias fundamentais, como carrega a conquista de ter sido a primeira mulher na área do Direito, no Norte e Nordeste do Brasil, a ser bolsista de produtividade em pesquisa.
Mulheres na Ciência é um conteúdo especial desenvolvido pela plataforma MT em parceria com a Universidade de Fortaleza (Unifor) para dar visibilidade ao trabalho de mulheres cientistas que atuam no Brasil. A professora Ana Maria D’Ávila é a quarta entrevistada da série.
LEIA MAIS >> Mulheres na Ciência: Andréia Formico desenvolve programa de monitoramento de leitos e jogos sobre câncer
Mulheres na Ciência: Normanda Morais estuda a resiliência dos indivíduos em situação vulnerável
Mulheres na Ciência: Raimundinha Magalhães se dedica aos apps de Saúde Móvel
“Atualmente, trabalho dedicada à análise e às repercussões das decisões dos sistemas Interamericano e Europeu de Direitos Humanos”, complementa a professora, que é titular Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (Unifor). Apesar de não realizar mais pesquisas em campo, ela acumula extensa experiência de trabalho com crianças, indígenas e pessoas traficadas.
A atuação acadêmica de Ana Maria envolve, ainda, a coordenação do grupo de pesquisa “Direitos das Minorias e Pessoas em Situação de Vulnerabilidade”; e a coordenação de três projetos que contemplam a violação de direitos humanos pelas empresas; e a análise das decisões das cortes Interamericana e Europeia de Direitos Humanos. “Escolhi a profissão quando tinha 9 anos porque queria trabalhar na defesa dos direitos humanos das minorias e das pessoas em situação de vulnerabilidade”, lembra a professora, atestando a sintonia com a área em que atua.
Na pesquisa e nas conquistas acadêmicas, Ana Maria tem a trajetória marcada por desbravar fronteiras e realizar feitos inéditos. Nascida no Peru, ela se graduou no país de origem, realizou parte da formação acadêmica no Brasil e fez pesquisa de pós-doutorado nas universidades de British Columbia, Ottawa e York, no Canadá; Yale, nos Estados Unidos; e Auckland, na Nova Zelândia. E no Brasil, foi a primeira mulher na área do Direito a ser bolsista de produtividade em pesquisa no Norte-Nordeste do Brasil, recurso concedido a doutores com alto desempenho.
“Nesses mais de 20 anos como pesquisadora, parece-me que minha principal contribuição tem sido a formação de jovens pesquisadores que compartilham o meu mesmo interesse em aprimorar as formas de proteção jurídica dos direitos humanos”, completa Ana Maria.
VEJA TAMBÉM >> MT Cast #20: Mulheres na Ciência parte I
MT Cast #21: Mulheres na Ciência parte II
Apesar de refletir a excelência da produção acadêmica da cientista, a bolsa revela também que o Direito precisa percorrer um longo caminho para que a pesquisa seja inclusiva e diversa. “Ainda somos menos de cinco [mulheres] e nenhuma é bolsista PQ1, que é a categoria superior. Acho que esses fatos dizem tudo”, lamenta Ana Maria.
E não só a questão do gênero impacta a pesquisa no Direito, como a própria distinção entre ciências exatas e estudos sociais. Essa visão, segundo a pesquisadora, é um erro comum não apenas entre pessoas leigas, mas também na própria comunidade científica, que associa “pesquisa ao conhecimento matemático ou experimental, menosprezando as ciências humanas e sociais, nas quais a pesquisa obedece a outros parâmetros”.
“As principais transformações jurídicas vinculam-se diretamente às transformações que acontecem nas outras áreas do conhecimento e na própria sociedade, haja vista o Direito ser uma ciência social e, portanto, ser diretamente afetado pelo que acontece no meio em que é aplicado. Assim, o desenvolvimento dos meios de comunicação tem, por exemplo, repercutido diretamente na proteção do direito à privacidade das pessoas. A crise ambiental tem seus reflexos estudados pelo direito ambiental. As mudanças das relações familiares tem alterado as concepções jurídicas relativas à família, etc”, elenca Ana Maria D’Ávila.
Garantir à ciência do Direito o devido valor, considera a professora, envolve, antes de tudo, “levar a sério a pesquisa e evitar que convicções religiosas ou políticas interfiram na compreensão do que é ciência”. Além disso, otimizar os já escassos recursos dedicados à pesquisa no Brasil.
“Como pesquisadora, que também cumpre função de avaliadora de projetos científicos e concessão de bolsas de estudos do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), tenho me deparado com muito projeto que não obedece as mais mínimas regras cientificas ou sem qualquer potencialidade para contribuir com o avanço da ciência e do bem-estar social”, argumenta.
Este conteúdo tem o apoio da Pós-Unifor, a pós que evolui com o mundo.